O Nada
Ah, como gostaria de estar sofrendo...
ao menos assim
estaria sentindo algo.
Afastaria nulidades,
traria vida.
Sofrendo,
teria pelo que lutar,
ao menos do que fugir,
e afastaria o ócio.
E afastaria
o ócio.
Ou odiando,
odiar a indiferença.
Odiar faria diferença.
E sentiriam algo por mim,
me odiariam,
me notariam.
Seria alguém sem mal?
Alguém notado?
Como decidir?
Como gostaria de decidir...
ao menos assim,
estaria sentindo algo.
Um pouco do meu sofrimento
A arte de escrever
analgésico pra mim
covarde
Pensar o dia-a-dia...
o não pensar do dia-a-dia...
Se aliviado
farto-me de compor
como se vocês
aplacassem minha dor
ou absorvessem
um pouco do meu sofrimento
e as fotografias da minha percepção
os devaneios da mente
fizessem sentido
em meio ao caos de sentimentos
nos quais me perco
nos quais sou.
Caros Colegas
Estou em meio a multidão
rindo, conversando,
mas sei que, na verdade, estou
só.
Sei, e mesmo assim
é tão difícil
me doar completamente,
deixar que se aproximem.
Ninguém o faz.
Ninguém.
É mais fácil ficar quieto.
Fechado.
Fúteis preocupações tomam
todo o meu dia.
Estudo continuo para buscar
ser alguém.
Melhor?
Dinheiro, Prestígio e Reconhecimento.
Mesmo que alcançasse tudo
não teria nada.
Vazio...
Não me conhecem por inteiro.
E não o querem.
Não conheço ninguém por inteiro.
Será que realmente quero?
E assim levo a vida.
E todos levam a vida,
até que ela nos leve.
Enquanto isso,
o tempo passa por nós:
seres racionais tão cegos.
Não conseguimos ver,
nas pessoas próximas,
a dádiva da amizade.
Não vemos
e não vivemos.
Mas isso é comum.
Natural.
Incerteza
Abro os olhos.
Antes: absorto em pensamentos,
agora? A realidade.
Nenhum esclarecimento.
O mundo,
como solução,
nada me traz.
Me mostra, apenas,
e novamente,
você.
Minha mente,
cada vez mais
na iminência do colapso.
Sua voz,
palavras doces.
No tom,
clamam por proximidade.
Olhar tentador.
Gestos que,
simplesmente,
me prendem.
Mas ainda que
atraído e fascinado,
não consigo,
para me fixar,
nuvens suficientemente
macias e densas.
O vento traz
novos odores e sensações,
tempestades ou o sol.
Espero por certezas.
Distância
Lágrimas amargas
manchando o papel
de angústia,
tristeza.
Na esperança
de que o choro fique doce e leve
acompanhando o largo sorriso
após o retorno.
Mando contigo
a quase cheia
lua.
Amarela do tempo
num céu turvo, cinzento
sem estrelas
e sem brilho.
Lua de saudades.
A névoa do Equador
desce como cortina
encurtando drasticamente
a despedida entre dois hemisférios.
Dois mundos tão distintos.
Ricos e vastos mundos
complexos infelizmente,
independentes, mesmo sem querer.
Meu manto já não te alcança.
Temerosa sensação...
Passaria a estar desaquecida?
Desprotegida?
Bobagem,
a menina cresceu
já sabe pensar...
pode escolher e agir.
Será que de mim
irá se lembrar?
Enquanto sob
malhas e cobertores
aguardarei
quieto,
ela lá estará
entre brilhantes monumentos
e a História.
Trará novas histórias?
A insegurança
e o mal que acometeu Otelo
dançam em minha mente
em um inebriante balé
removendo aquilo que parecia
preso e certo.
Onde meu coração poderá
encontrar um Porto Seguro?
Precisa de ataduras...
um anestésico.
Serão a distância
e o tempo
fortes o suficiente?
Pisarão sobre a fina teia
que, iniciando em mim
estende-se até ti?
Procuro
junto com as respostas,
no solitário beijo de adeus,
as juras que tua alma faria.
Porém este expira sem antes cumprir sua missão.
“Vento trás
você de novo
Vento faz
do meu mundo novo”
Talvez junto com tuas radiantes melodias,
oportunidades e o sol
voltem a nascer.
Separação
Sabe quando tanto faz?
Uma pena,
tão belos
eram os sinais,
o peito apertado,
olhinhos ansiosos,
e o beijo,
um acordo selado.
Não estou mais envolvido,
mas o tempo deixa suas marcas,
momentos felizes não serão esquecidos,
nenhum de nossos dias será devolvido,
eles foram, dia a dia, vividos.
Você voou,
me deixou pra trás,
mas sem angústia,
sua ausência trouxe paz.
Sabe quando tanto faz?
A saudade que sentia,
num simples sopro se desfez,
mas de tudo que dizia,
acredite, nem por uma só vez,
mentia.
Sou responsável,
pois sei que te cativo,
me fala que te atordôo,
mesmo sem motivo.
Sabe quando tanto faz?
Para ficar junto,
já não há razão.
Para o porquê de não dar certo,
nunca houve explicação.
Portanto,
goste de mim,
como gosto de você,
não o bastante para continuar,
mas o suficiente, para nunca te esquecer.
Jogos
Como pôde?
Não deixou para trás
apenas o que a estava entretendo.
Foi derrubando pelo caminho,
largando,
tudo o que há de valor,
tudo, que há muito prezava.
Tanto tempo...
palavras rudes.
Tanta história...
mais nenhuma palavra.
Na busca,
esqueceu dos sonhos.
Fantasias, brincadeiras...
Negligenciadas.
Ah, M A T U R I D A D E...
Por que não existem
maquinas do tempo,
apagadores de ações,
aparadores de tristeza?
Fariam sucesso...
Quilos de cimento
sobre aquele coração
até a pouco aberto.
Exposto...
Os dias fluem
(mesmo truncados,
sofridos),
o cimento endurece.
A luz se apagou,
mas o palhaço solitário
não consegue dormir.
Risadas solitárias...
Já perdeu a graça.
Volta àquelas tardes (tentativa)
Se, em meio a multidão
pega em minha mão
e dá-me um beijo,
porém sem nunca
voltar-se para meus olhos,
talvez não seja a mim que deseja.
Se, em nossos encontros,
a farta conversa logo se torna escassa
para que o silêncio então
tome nossas bocas,
talvez não seja você que me queira.
Talvez, imperceptível e etéreo
o tempo tenha se infiltrado
em nossos laços para afrouxa-los
e o obstáculo da estranheza no reconhecer
seja mais poderoso
que a vontade em reatar.
Mas, mesmo que haja um desfecho
em que nem um, nem outro
saiam com o coração leve,
acredite que, sem lágrimas,
este poema eu jamais assinaria.
A lágrima
Os lábios
que abrem o sorriso
só desejam
que as lágrimas
derramem.
Mas secas,
ardem ao descer
pelo rosto,
e nem chegam
a percorrer seu caminho,
selar seu destino.
Morrem,
como se nunca
tivessem existido.
Pulsar
Finalmente a encontro,
e tal um anjo,
ou melhor, uma musa,
desperta em mim
algo a muito adormecido.
Chega sorrateira.
Toma-me um beijo,
e outro mais.
Atiça...
É tarde, estou envolto.
Matéria em movimento,
sua pele de encontro a minha.
Sensações afloram...
Indescritíveis.
O corpo,
já aquecido, recosta-se;
e tomba exausto,
satisfeito.
O coração,
ainda imaculado,
segue recalcado em meu peito,
ansioso...
Mas os olhos da musa
não o clamam, nem o chamam.
Resta-lhe apenas,
frio e solitário,
a doentia espera.
Até que suas tentativas,
por desesperança,
se interrompam.
E juntamente,
há de cessar a precária irrigação,
nutrida a sonhos pueris,
para que, só então,
em meio a silenciosa agonia,
ele possa parar de bater.
Telefone
Tento lhe sentir...
não alcanço.
Atado em meu próprio quarto;
restrito.
Impedido de ir
aonde antes
considerava meus domínios.
As horas passam,
destroem,
corroem tudo em minha volta,
menos seu rosto e sorriso.
Fotos não envelhecem
e você,
linda, arrumada...
sensual,
a meu lado,
barba por fazer, despenteado...
largado.
Enfim o telefone toca.
Sete minutos de atraso!
Mas está tudo tão escuro...
Poderia finalmente
sentir a voz de minha foto,
dar-lhe vida;
acalmar minha alma,
dar-lhe paz.
Maldição!
Não consigo acha-lo.
Segue chamando...
De onde vem o som?
Não sei nem em que direção
partir para procurá-lo.
Por que está tudo
tão disforme e diluído?!
Só o que vejo são vultos.
Esbarro no porta-retratos
que tomba,
esfacela.
No piso, cacos de vidro cortantes.
Sobre seu rosto pisado, sangue.
A janela abre,
sinto frio por dentro.
O vento leva os papéis para fora,
para a tempestade.
Minhas poesias...
Lama.
Ele toca próximo ao meu ouvido.
A natureza ruge
tentando entrar,
mas quando me viro
desaparece
e se cala.
A chuva cessa,
a persiana fecha.
Mal se distingue
o corpo único,
sentado e encolhido,
no canto do enorme aposento.
Mal se percebem
lágrimas
quando já se está molhado.
Quartinho dos fundos
Tudo parece confortável
(ao menos de longe).
Mesa posta
vinho, champagne...
A taça, delicadamente,
toca seus lábios,
umedece a boca
e, um pouco,
desliza por sua pele
acariciando o início
de seu queixo.
Chama meus olhos,
a beleza do vestido que,
tal um lençol acetinado,
apenas rela-lhe o corpo
nos insinuantes pontos
de maior curvatura.
Sonho...
Hei, espere! Aonde vai?
A fresta pela qual
posso deixar meu olhar te tocar
é pequena demais...
Quem é este
entre eu e você?
Em meu quarto escuro
o ar é pesado,
e o calor, insuportável...
músculos doem,
e o frio que sinto
em nada refresca,
apenas gela,
torna frágil,
e quebra.
Não há janelas.
Não há saídas.
Nada distingo a minha volta...
Mesmo que houvessem
pés-de-cabra ao chão,
a noite daqui
me impediria de acha-los,
abrir a porta.
Mesmo em uma sala de espelhos
não conseguiria me ver.
O calor me tomba,
exausto.
Gélido suor
pontua a face;
lágrimas escaldantes
queimam a carne.
Meu frio me some a voz,
interna.
Acho que me notou!
Vêm em minha direção...
Ah, quando estiver lá...
o vento, sem mormaço,
quebrará meu gelo.
Reencontrarei sorrisos.
E a mim.
Quando estiver lá,
sentarei à cadeira de balanço
e beberei sua taça...
para reaver minhas forças,
meu sono.
Quando estiver lá,
você, em meu ser será,
e ele já terá ido.
Estará distante...
vago.
Quando estiver lá...
Pára!
Não faz isso!
Não fecha a...
porta.
O sabiá
Desperto.
Olhos cerrados
se abrem com dificuldade.
Mal enxergo...
a claridade,
há tempos incomoda.
Sou casca vazia,
prestes a quebrar...
rachado,
e sem muito,
sem tudo,
do que antes tinha.
Me viro devagar,
com cuidado.
Lhe dou um beijo,
vagaroso e preguiçoso.
Percebo que nunca
havia achado nada.
(continuava longe?)
Em seus lábios
vou ao infinito,
sem estrelas porém,
escuridão apenas.
Dois corpos frágeis,
despovoados,
esfacelam mais rápido
em contato,
e simplesmente,
a deixo ir.
Mas não existe motivo
para preocupar-se.
Os ideais,
derradeiro luxo da juventude,
foram enterrados
junto ao belo e singelo
sabiá.
A criança perversa
o aprisionou e apedrejou
até sua camisa
escorrer sangue
da boca dos cachorros
famintos, mesmo ao devorar
o recém-nascido gatinho
que foi arremessado,
indefeso,
dentro dum saco,
do outro lado do muro.
Desde então,
foram cortadas
as asas em que voava.
E não cicatrizaram.
Chagas abertas,
até que o último sonho
escorra por meu corpo
e seque no chão.
O relógio de Alice
Pelo obscuro corredor
tento me esgueirar...
A escuridão impede,
que se revele,
todo e qualquer acontecimento.
Meus olhos:
habituados a escuridão.
Prefiro mantê-los fechados.
Um tímido feixe,
e estaria cego.
Mesmo diante de possibilidades
novas, incríveis, exuberantes,
escolho pela segurança.
Vista perfeita,
para usar adiante (mesmo?).
Trago em minha mão,
um relógio.
Espero que desperte...
Por quantas vezes,
durante meu caminho,
irá tocar?
De que irá me alertar?
E se abrisse meus olhos?
Não, não preciso nada antever.
As trevas somente distorceriam
minhas impressões.
Sentindo,
realmente e a cada momento,
daria meus passos;
transporia obstáculos;
e estaria preparado
para o seu soar.
Agora,
só me resta saber
se irá tocar.
A torre e as máscaras
A espiralada
escada do palacete
sobe,
e parece não ter fim,
somente minha vontade.
Imensos vitrais,
adornos,
que nada transparecem
para quem vê,
ou tenta.
Tarde de verão
com gola alta.
O ar, estático,
se move apenas
com o escorrer do suor.
Água escaldante,
sai por meus poros
e gruda os cabelos lisos,
mas opacos e sem vida,
no rosto seco,
pálido.
Escorre e pinga,
percorrendo
denso, pesado
e livre,
os andares que já subi
Perco de vista,
vai mais fundo
e chega ao porão,
sujo,
que de minhas memórias
já havia desaparecido.
Com violência,
encontra o chão
e bate.
Ecoa.
Ecoa.
Ecoa.
Traz gritos,
que há muito não ouvia.
Murmúrios...
No escuro,
secou e sumiu,
mas o barulho,
não me deixa adormecer.
Parentes do passado,
vultos disformes,
etéreos,
que há muito não me visitavam,
não batem
e entram.
Cacos,
estilhaços de espelho,
do que fui,
a minha frente
em minha fronte.
O monte,
varrido para baixo do tapete,
transborda.
As máscaras de todos racham,
caem.
Não estou lá para ver.
Chego ao topo
da torre de marfim.
Panorâmica.
Ao longe,
embaixo,
à parte,
pessoas na vila...
rostos deformados.
Minhas mãos
só acariciavam
plástico.
Repulsa.
Avesso a todos,
e a mim,
observo:
Mais e mais
solitárias construções
são levantadas,
erguidas altas,
ao longe.
Apoiado no parapeito,
aguardo, passivo,
a mudança,
a invasão.
Minha velha alma,
cega, debilitada,
roga às jovens,
anjos
de demoníacas feições
(agora, porém, verdadeiras),
que a tirem dessa prisão.
Precipício
Tão bela pastora...
o penhasco,
no caminho,
desapercebido,
suave sensação,
maravilhas,
na queda,
esquecem o chão.
Correndo, um cavalo branco,
unicórnio de beleza.
Matadouro, matadouros,
trotando, suor e sangue
trotando, o silêncio
arrebata, some,
mesmo presente.
A tempestade,
da limpeza o símbolo
varre o ruim,
depois, indistinta,
escorre o belo,
aqueles
que se permitiam adormecer,
se permitiam a brisa.
Um poema,
sem dor,
não vale a pena,
tudo soando insensato
ela, tão distante,
eu, sem sapatos.
Por que por alguém viver
que só vive com você?
Os pêlos crescem,
escondem músculos
mas também
banha e flacidez ocultam,
cabeça raspada,
fado irrefutável dos cabeludos,
o cabelo,
matéria morta,
sempre cai.
A razão
economizaria esparadrapos...
sempre tão inútil...
mal utilizada
inútil esforço
de abrandar a dor,
presente insônia
tentado conter tentativas
loucura!
Meu cego amor
a beira do precipício.
Como alvos alazões.
Areia
Escrevo, escrevo,
escrevo.
Bilhetes,
poemas, sonetos,
esperança de lembrança,
de mim...
Único para amantes,
genial para todos,
inesquecível,
como qualquer um gostaria de ser.
Porém, tudo é nada em pouco
anônimos, seremos todos ninguém,
lugar nenhum
em qualquer lugar
lugar-comum.
Como a concha,
calcário de milhares de anos
pisada pelo viajante.
Ele se banha,
na vila não é conhecido.
Afoga,
e mesmo com tanto a dizer,
lhe restam apenas,
dois gravetos em cruz;
lhe resta somente,
a madeira que irá apodrecer.
E a pequena concha,
junto ao papel de minhas cartas de amor,
desfacela,
e areia,
desliza suave para baixo,
da ampulheta faz parte.
Tempo passado
do tempo perdido.
Tempo esquecido,
o remoto recente.
O que o fez pensar que seria diferente?
Desabafo
Na escuridão,
não sei o limite
entre eu
e o espaço.
Perco o referencial,
temo me diluir,
deixar de existir...
Apavorado,
acendo uma vela.
Na solidão
não há limites
entre eu
e o animal.
Me esqueço do estabelecido,
me aqueço no vinho,
me esqueço.
Acordo em desespero,
procuro alguém...
de gesso?
Lambo as últimas gotas
que escorrem da garrafa,
mas não é suficiente,
não desapareço.
O zunido,
constante e agudo,
não desaparece do vazio.
Procuro e só vejo bestiais,
e quem enfim encontro,
nunca me vê como sou,
como me vejo...
como me via.
Talvez se voltasse a ser como era,
como imaginava ser...
o silêncio,
é esmagador agora,
e só me resta seguí-lo,
aceitá-lo.
Mesmo em pensamento.
Orgias
A cera,
quente,
mancha a tinta.
A velha vela
pouco ilumina.
As luzes estão apagadas.
Pessoas apagadas.
Mas o brilho,
minha paixão,
tiram-me o sono.
As casas dormem,
a cidade dorme.
Além daqui,
além de mim,
nenhuma vela acesa
me acompanha.
Começo a me recordar...
saia rodada,
levantada,
permitindo ao cheiro
de lascívia e desejo
que escorria,
tocar meus sentidos,
todos.
Na sala,
na poltrona dos pais,
no banheiro,
a sublimação pela carne.
Sua boca e corpo
me afastando
de tudo que é real,
me aproximando do céu.
Busco mais e mais...
a ansiedade,
o êxtase cru
e o relaxamento.
O antes,
o durante
e o depois,
repetidas vezes,
sempre.
Porém,
a inspiração não vêm,
nem uma só idéia...
Posso então concluir:
A felicidade,
nunca participou
de nossas orgias.
O campo e os tratores
O tempo todo,
interesse nascendo,
gente interessante,
morrendo,
logo ali adiante,
na vida comum,
vida a dois;
duas vidas,
não se sustentam
e quebram em seguida;
flores da sensibilidade
esmagadas,
mortas talvez,
no pátio dos tratores da razão.
Cinema
Vulgaridades:
o magro cão;
fartos banquetes
fartos clientes o enxotam,
sempre.
Debruçado à mesa...
Os óculos escuros do cego:
óculos que não contém beleza,
escuridão que não detém lágrimas.
Asnos pastando,
comendo, sobrevivendo...
Duro fardo, a proximidade.
Angústia imensurável, a solidão.
Poemas imaturos
que não saem do papel...
Não percebo o mal que me fazes
Não percebo o que me fazes
Que mal há?
Se alheio a tudo
não lhe percebesse
talvez viesse até a sorrir...
Doce deleite
o sonho antagônico à realidade
à vida
amor e liberdade
mas, infelizmente,
o filme acaba,
as luzes acendem,
e ao meu lado,
só resta você.
Agonias
Sua voz, no telefone,
já não tem a mesma doçura,
ou sua doce voz ao telefone,
já não alivia dor.
Domínios vastos,
dons e dotes,
e você se esvai por minhas mãos.
Vastos campos,
o sol forte,
e uma só nuvem
entre eu e o poente.
Dias perdidos.
Por você...
“Por você,
eu conseguiria até ficar alegre,
eu pintaria todo o céu de vermelho,
eu teria mais herdeiros que um coelho”
Por você, nada faria,
música, vazia soaria.
Sempre, são necessários segundos
para cair de onde subiu por anos...
Expulso do paraíso!
Fiz tudo, agora isso,
a penosa dor de cada dia,
agonia de viver
agonias.
E pelo telefone,
me manda um beijo...
me manda um beijo,
e mais nada.
Lareira
Procurando,
embaixo das cinzas,
o fogo fugidio
que insiste em se apagar,
que nunca será suficiente,
que nunca aquece como gostaria...
Contemplação vazia e fria
da bela lareira.
À sombra da árvore
“O amor
jamais poderá ser retratado
da mesma maneira que uma árvore,
ou o mar, ou qualquer outro mistério.
Ele é os olhos com que vemos
é o pecador que há no santo
é a luz que há na pintura”
é a alma que há em cada poema.
A árvore perde o viço,
definha, seca
solitária
eterna companheira de sua sombra.
O mar virou sertão,
apenas o mar de sangue, só,
ainda a jorrar
dos olhos
cristo crucificado
impossibilitado de,
pelos cravos,
se deixar cair,
de seu martírio desistir.
Terra de homens
busca perdida por humanidade.
Agora, dunas e dunas
o sol se põe
fatigado
castigado,
ventos rasgam o quadro
e estes, nos cegam
a tempo.
Veríamos santos nus
e anjos caídos,
asas quebradas,
não mais voarão.
A escuridão incomoda,
não mais contar
com o alheio sofrimento
para aplacar o próprio.
Cada um
enclausurado em sua própria angústia,
casulos de fel.
Nesta terra de cegos
se as almas tivessem voz
gritariam,
clamariam por punhais
que rasgassem a vista.
Sobre a árvore morta
um raio cai
e se faz fogo.
Porém,
ninguém pode ver,
e nem sombras restam.
A sombra
de um poema sem alma,
nesta terra sem amor.
Fim
Sentado nesta cadeira,
preso neste caixão,
observo as moscas,
que pousando varejeiras
repousam
em minha carne mal cheirosa...
Podridão.
Por que tanto sofrimento?
Primeiro os braços,
então as pernas,
membros decepados um a um,
os dentes,
estraçalhados numa só paulada,
e meus olhos
nem haviam sido vendados.
By the way,
who knows why?
As certezas
desmoronam sempre em sopros,
como num castelo de cartas.
A dor...
nem me preocupo com a perda.
Se tivesse sido talhado,
sentiria mais.
É melhor que me tenham mutilado...
A pressão é insuportável,
tenho de gritar,
mas de minha boca,
verte apenas sangue,
como do resto de meu corpo,
e parece nunca coagular...
Angústia sem fim.
Finalmente chegaram!
Ratos e ratazanas,
vêm de longe,
em bandos.
Como abutres,
sentem o cheiro
de quem não pode se defender,
dos animais agonizantes.
Bebem meu sangue,
sobem em meu rosto,
pela essência que escorre de meus lábios,
e vejo tudo,
até que, meus olhos, devoram.
Melhor assim,
limpam a carne de meus ossos,
e enfim posso, puro,
voltar à terra pura,
e sem contamina-la,
tentar começar de novo.
Os cães
Corro em direção à praia...
A vontade de gritar é tamanha,
que o pulmão se fecha,
e o alarmante protesto
vira choro silencioso.
O coração dispara,
faz que eu aperte o passo,
mas as pernas,
são cada vez mais curtas,
e como se estivesse aprendendo,
corro e caio,
o tornozelo torce,
e os gravetos...
os gravetos
levam meu pé
a lavar o caminho.
Marcas de sangue
para a volta
de uma viagem sem volta.
A lua cheia,
de dó e de pena,
revela, além de contornos,
formas.
Se tirasse os olhos
do mar no horizonte,
não haveria tanto sofrimento,
evitaria os obstáculos da noite...
A dor,
agora turva a vista,
não me deixando
ir longe na praia
(Melhor assim).
O sal em meu sangue
oferece o último momento
de consciência, sanidade
e desespero.
O sol nasceu.
O corpo ressecado estala,
as costas ardem,
junto às bordas,
que ontem fiz
em meus pés,
não restando dúvidas,
o sol nasceu.
Dia claro,
ao meio-dia.
Os cachorros vêm,
e lambem minhas feridas
mesmo em meio a tanta gente.
Em meio a tanta gente,
são os cães quem vêm,
e lambem a ferida.
Um comentário:
Eu particularmente gosto muuito das dores rsrsrs
bjao
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