quarta-feira, 21 de fevereiro de 2007
Decisões
Decidira ir. Como quem desobedece a mãe e, diante de uma proibição expressa, espera que todos adormeçam para vivenciar o perigo. Era o que fazia: misto de desconforto e excitação. De fato, todos haviam adormecido. Aquela casa estranha. Passos silenciosos para não incomodar, acordar, cheiros e fronhas que não eram dela. Não deveria estar ali, mas tendo decidido, aproveitava-se do turbilhão para tentar se esquecer, se aquecer, mãos hálito bocas novas sensações toques que invadem lambem tiram a roupa sentem a pele na pele mergulham se perder me perder em mim em ti olhar para além da carne janela da alma anseios desejos vontades legítimas sensações sutis penetrantes penetrada. Ele não tinha o direito de mexer ali, quem era ele afinal de contas para ela se entregar? O movimento daquela língua desconhecida e estranha era agora o movimento de vermes tentando violar a carne, estava sendo violada, era somente carne e a carne, flácida, fedia. Sem saber o que fazer, sem nem saber ao certo onde estaria, assustada se agarrou a ele que não parecia também entender nada e parecia ser o único que poderia salvá-la, o quase-estupro que sofria, sofria. Ele, já meio atordoado, respondeu ao abraço forte, deixou que ela se agarrasse. E ela se tranquillizou. E ele se aquietou. E quase dormiu. E de repente tudo a sua volta se tornou sem encaixe, pontiagudo, disforme, diluído, coração disparado e ela não conseguia mais parar, de pensar, de mexer, de olhar à sua volta, e tudo tão escuro, e tudo tão estranho e precisava acordá-lo e acordou e precisava ir embora, (ele, que nesse ponto não entendia mais nada, era tão compreensivo... ele que depois se sentiria irado, puto, desprezado e desprezível, enojado, distanciado, descartado, impedido. Ele, tão compreensivo...) precisava que abrisse a porta, precisava que a levasse até lá, não, não podia esperar mais um pouquinho
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8 comentários:
cof cof cof...Atchiiiiiiiiim!!
cof cof cof...Atchiiiiiiiiim!!
hein?
Gostei. É Bonito, mas parece triste.
Vc se sentiu feliz? Sente-se feliz agora?
Não parece feliz...
Conseguiria me responder sem que eu me identiique?
PS: vc gosta disso ou prefere se abster de resolver mistérios xulos?
"Como se eu estivesse por fora do movimento da vida. A vida rolando por ai feito roda-gigante, com todo mundo dentre, e eu aqui parada, pateta, sentada no bar. Sem fazer nada, como se tivesse desaprendido a linguagem dos outros. A linguagem que eles usam para se comunicar quando rodam assim e assim por diante nessa roda-gigante” Caio Fernando Abreu –Dama da Noite.
A questão era um medo de si. De se entregar a seus desejos, sentir, gozar. Não podia, não podia! Já tinha ido longe demais! Pessoas desconhecidas, bar a meia luz, cerveja, beijo na boca ferida. Corpo cheirando a cigarro, óculos sujos. Vontade de deitar nua, de sentir aquele arrepio que percorre o corpo quente. Saliva grudada no rosto, no pescoço, na orelha... vontade... vontade... vontade... foi tanta vontade, foi tão de verdade que não agüentou. Podia mesmo? Merecia ser? Merecia sentir? E sentiu medo. Medo de ser.
Resolver mistérios xulos? Prefiro quando eu sei com quem eu to conversando, mas, enfim...
Feliz? Eu nunca estou feliz, sou maior voraz, como disse uma conhecida psicanalista, nunca estou satisfeito...
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