E se ela não voltar a noite inteira, o que ele vai fazer a noite inteira,
e se voltar
à meia-noite e for direto para a cama
o que vai fazer enquanto ela dorme. Amanhã lhe dirá que o
dinheiro dela está a salvo, que de agora em diante está livre, e que ele
não serve mais para nada. Por volta das nove há um corte de energia,
e como
um alpinista solitário vendo
a noite cair num lugar desconhecido, ele tateia no escuro, encontra
uma
lanterna, as sombras giram ao redor. Cansado de sombras, ele
desiste e vai até Bettine, que também está no escuro,
apenas uma pálida luz
de emergência
acesa ao lado da cama. E como a luz não volta e a lâmpada de
emergência se
apaga, ele se vê contando que um passarinho não convidado, todo
molhado, foi fazer seu ninho
lá na sua casa, e que ainda hoje ele próprio a tinha feito -
por quê? - bater as asas. Lendo nas entrelinhas, Bettine captou
seu segredo e o achou, por um lado, de um ridículo cruel, por
outro, triste e
vergonhoso. Tomou a mão dele
na sua e ficaram ouvindo o mar ao longe, revolvendo-se nas
profundezas
da escuridão, e então as mãos se estenderam e se tocaram, um
abraço
tímido, sem se despirem, um pouco pela solidão da carne, outro
tanto por afeto e
compaixão. Bettine
soube por instinto que Albert estava imaginando uma outra ao
tocá-la, mas perdoou: não fosse pela outra,
nunca teria acontecido
Amós Oz - O mesmo mar
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