Mas quem ficaria aborrecido, me diga, Albert, se você falar uma
única vez.
Você não quer me aborrecer? Ou a ela? Ou a você mesmo? Afinal,
nós somos
o que somos.
Nem sócios, nem parentes. E nem estamos no jogo homem-
mulher.
Você tem setenta, eu tenho sessenta. Não somos um casal, mas
apenas duas
pessoas.
Conhecidos? Amigos? Ou mesmo colegas? Mais ou menos?
Um pacto para um dia de chuva? Afeição de fim de tarde? Nossas
pernas
cruzadas. A minha cruzada
sobre a minha, a sua cruzada sobre a sua. Você de frente para mim
e eu de
frente para você. Li certa vez que um homem e uma mulher não
podem ser
apenas amigos: ou são amantes
ou não há nada entre eles. O fato é que sou tão má quanto você.
Não falo
nenhuma palavra sobre o Avram. Tenho medo - se eu falar,
talvez fique tão constrangido que acabe fugindo.
O que sobrou? Chá de ervas. Melancia. Queijo. Investimentos.
Indexação. Poupança. Fundos de assistência. Pernas cruzadas,
você
e eu. Sua perna na sua, a minha na minha. Temos cuidado
com as palavras, caso a gente - Deus nos livre! - se encoste.
Estou relaxada
e você está calmo. A luz neon espalha claridade
em tudo aqui. Embaixo da varanda o cascalho empoeirado.
Perdoe-me, Albert, não fique chateado, de repente sinto vontade de quebrar um copo. Pronto, quebrei. Desculpe.
Você vai me perdoar.
Deixe que eu varro, não se incomode.
Amóz Oz O mesmo mar
3 comentários:
As vezes acho que chegou tão perto de mim que não consegue me ver...
Outras, como enquanto estou de olhos fechados te abraçando, acho que me conhece mais que deus...
Está tudo doendo.
Como antes, dói quando respiro.
Há coisas que não te contei. Mas acho que talvez saiba. Se notar, talvez sinta, talvez reconheça o cheiro.
Não, acho que já contei, mas você não pode/quis ouvir...
Ah, esqueci de dizer, ótima escolha do texto! E obrigada por me apresentar esse autor que agora é um dos meus prediletos.
Lindo texto
A propsosito seus textos tbm são lindos, lembro-me um que o Edu leu antes das férias, eu quase chorei...
Bjus
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