sexta-feira, 20 de janeiro de 2006

Ter 20 anos e beber sozinho em casa não é algo aceitável. É, no mínimo, pedir para ser visto como alcoólatra, ou um sujeito implorando por ajuda.
Fiz a experiência inversa, passando sóbrio a virada de ano. Percepção distorcida de uma realidade que parecia estática, algo beirando a psicodelia, em um estado de ânimo diferente do habitual e do resto dos que se encontravam em volta, embora dessa vez a distorção não me alegrasse ou me ajudasse a me enturmar. Houve momentos de quase desespero, tentando me convencer de diversos modos a dançar ridícula e alegremente e brindar e beber e rir à toa em um ritmo claramente induzido para a dança, o brinde, o riso, enquanto cada um segurava uma cerveja e um vinho, ou um whisky e uma vodka, ou uma pinga e uma garrafa de espumante. E ficaram bravos e chateados e preocupados, um que não pertencia e não pactuava, um que não ia, ET que gerava curiosidades e sorrisos complacentes e desprezos e tentativa de compreensão e me deram um banho de champagne para que saísse dessa letargia e me juntasse e me puxaram e me empurraram e empurraram um colar havaiano e me abraçaram e beijaram e notei que estavam só começando e que eram todos desconhecidos para mim, ou para o que de mim é sóbrio ou para o que deles é bêbado e decidi ir para cama e decidi começar um ano diferente.


OBS: O que é descrito nesse conto se baseia em uma história real, sem no entanto coincidir com ela de maneira "verdadeira" ou "absoluta". Mesmo sabendo do poder das palavras, espero que ninguém fique chateado

8 comentários:

Danilo SG disse...

Deus lhe pague

Chico Buarque
1971

Por esse pão pra comer, por esse chão pra dormir
A certidão pra nascer e a concessão pra sorrir
Por me deixar respirar, por me deixar existir
Deus lhe pague

Pelo prazer de chorar e pelo ``estamos aí''
Pela piada no bar e o futebol pra aplaudir
Um crime pra comentar e um samba pra distrair
Deus lhe pague

Por essa praia, essa saia, pelas mulheres daqui
O amor malfeito depressa, fazer a barba e partir
Pelo domingo que é lindo, novela, missa e gibi
Deus lhe pague

Pela cachaça de graça que a gente tem que engolir
Pela fumaça, desgraça, que a gente tem que tossir
Pelos andaimes, pingentes, que a gente tem que cair
Deus lhe pague

Por mais um dia, agonia, pra suportar e assistir
Pelo rangido dos dentes, pela cidade a zunir
E pelo grito demente que nos ajuda a fugir
Deus lhe pague

Pela mulher carpideira pra nos louvar e cuspir
E pelas moscas-bicheiras a nos beijar e cobrir
E pela paz derradeira que enfim vai nos redimir
Deus lhe pague

Monalisa Casa-2 disse...

Putz. Tive essa experiência por duas vezes, até levei uma champagnhe sem alcool...rs
Psicodelico mesmo, estado único de espirito. Mas não pude ir para minha cama dormir antes das 11h do dia 1o, isso foi foda.

Flor disse...

Passei 22 anos nesse estado....e ainda hoje, na maior parte das vezes, é assim que vejo. Mas por favor, a alegria é um estado de espirito que se só for adquirido com alcool é preocupante. Dançar, gritar se divertir tem que ser feito, antes, sem alcool, ai depois o alcool pode até ter sua graça.....
beijos!!!!

Anônimo disse...

A recusa pelas lentes coloridas talvez deixou passar aos olhos a realidade colorida inventada praquele dia. Os adornos simbolizavam histórias, experiências e lembranças. O estouro da champagne, algo além da simples embriaguês. Embora catalizada pelo álcool, a alegria era de todo sincera; e, acredite, mais sincero ainda o gesto que te entregava o colar havaiano. Era um convite, ingênuo e puro, e nada marcado por qualquer tipo de estranhamento. Este gesto, porém, ainda existe, ok?

Sem qualquer ressentimento, apenas usando outras palavras (menos poéticas que a sua, porém)para pensar o significado da fantasia daquele dia.

Anônimo disse...

Muitíssimo bem escrito, antes de tudo (do álcool inclusive).
Abç! (A partir deste ano, sempre sóbrio.)

Rubis disse...

Repito, sem mágoas, sem tristeza: se baseia em uma história real, SEM no entanto coincidir com ela de maneira "verdadeira" ou "absoluta".
Adorei a passagem de ano. É só uma história

Anônimo disse...

muito sabias suas palavras... valeu a esperiencia para seu relato fiel a sua realidade inconciente ...

Rubis disse...

Putz, fico mto curioso com esses comentários anônimos...